sexta-feira, maio 28, 2004

28 de Maio



Estou decepcionado por ninguém se lembrar do 28 de Maio. Eu também não sabia como o comemorar, até do Portugal Profundo, via Sexo dos Anjos aparecer o filho de Santa Comba numa variante pouco conhecida. Tenho curiosidade em estudar a personalidade de alguém que vista uma tanga com o Salazar em tal sítio (para disfarçar o último pingo?). A loja também fornece uma "pide bag".


quinta-feira, maio 27, 2004

Porto


1. Como sulista, elitista, pseudo-cosmopolita e, enfim, mouro, tenho por Rui Rio a maior admiração. Se ele ganhar as próximas eleições, saberei que Portugal ainda não está completamente perdido.

2. Para um leigo, o que impressiona no FCP é a armadura psicológica da equipa que faz lembrar a táctica romana da tartaruga. Cada jogador parece diluir-se na equipa e, ao mesmo tempo, ultrapassar-se devido à equipa. E é tão eficaz que se transmite ao espectador: é natural que o Porto ganhe, seja qual for a equipa. Não porque tem o jogador A ou B ou C mas porque é a equipa.

3. Para Portugal, o Porto é um corpo estranho, e muito pouco português. A transformação de um grupo numa equipa nunca acontece em Portugal. E assumir, humildemente, o princípio de que pode ganhar seja o que for, seja a quem for, é completamente absurdo, excepto quando estamos na fase ciclotímica adequada (até que um cão ladra e lá se vai a bravata).

4. Claro que a nossa popular ciclotimia nunca nos levou a lado nenhum, mas é muito mais divertida do que esta coisa da eficiência, eficácia, concentração, planeamento... (e, além disso, estamos aqui tão bem, a dizer mal de nós, como eu, aqui, agora, e sempre).

segunda-feira, maio 24, 2004

Independenciazinha

A nossa independenciazinha tonta é feita de medos. O povo tem agorafobia, as elites incompetentes têm medo da concorrência. O povo quer pão e circo. Quanto mais circo e pão encontrar do outro lado da fronteira, mais perceberá que isto da independência "é lá entre eles". Só tem valores abstractos quem não tem fomes concretas.

Não damos à nossa independenciazinha simbólica qualquer valor instrumental. É apenas uma independência de maltrapilho solitário, complexado e misantropo. Orgulhosamente só, porque sim.

Sugiro uma sondagem com a seguinte pergunta: "Se uma união ibérica lhe garantisse melhor nível de vida, estaria disposto a aceitar uma partilha igual de soberania entre todas as regiões da península?" (Sim, a formulação pode ser melhorada.)

Não sabia que a cobertura televisiva do casamento real tinha sido "absurda". Não vi. Não me interessa. Tenho cada vez menos estados de alma sobre o que os outros vêem na televisão. As televisões fazem o que lhes deixam fazer para ganhar dinheiro. Tal como quase toda a gente que o pode fazer. Portugal não é muito diferente da Albânia. E, circo, temos muito.

domingo, maio 23, 2004

Fim do jogo em Troia

Esta semana, o meu consumo cultural oscilou entre dois extremos: uma super-produção e uma indigente-produção. A super-produção está em cena no Espaço Karnart, e é uma notável encenação de Endgame, de Beckett, com dois actores absolutamente brilhantes (o Tiago é mais explicadinho).

A indigente-produção está em exibição em quase todos os cinemas, chama-se Troy, e julgo saber que foi financiada pela Al-Qaeda, num acto de terrorismo sofisticado que pretende destruir os mitos da cultura ocidental. O cavalo de Troia ganha novas variantes.

sexta-feira, maio 21, 2004

Um manhouço de dúvidas

Haverá uma tradução mirandesa do hino nacional? E se a há, é na versão do mirandês normal, raiano ou sendinês?

Dicionário português-mirandês: "magarcinha s.f. Espécie de queimadura provocada pelas substâncias libertadas pelas margaças, em particular quando se mantêm em contacto com o pé, dentro do sapato." Sabem que os mirandeses distinguem 100 tipos de queimaduras?
Soa-vos familiar?

"Mariconço", por outro lado, é um "insulto grave sem um significado preciso". É um insulto genial, porque permite a máxima customização: é o cliente do insulto que define, por especulação, o que é para si um insulto grave. É marketing one-to-one avant la lettre.

No dicionário de português-mirandês, megabyte é seguido de megalítico. Uau! Estas vertiginosas viagens no tempo...

Qual é a profundidade do Portugal profundo (presumo que medido a partir das Portas do Sol, perdão, do Terreiro do Paço)? Podemos dizer que Alcobaça, por exemplo, já é suficientemente fundo, ou ainda temos pé? E o Cacém? Será uma fossa (no sentido oceanográfico, naturalmente)?

E o país real contrapõe-se a quê? Será uma espécie de caverna platónica, revista e georeferenciada, em que o que pensamos ser o real são realmente as sombras projectadas na parede da caverna pelo telejornal da TVI?

Será que o triângulo místico Tomar, Fátima, Jerónimos, poderia ser substituído com vantagem pelo triângulo Lisboa, Porto, Madrid, pintado a verde e adornado com a expressão "el corte ingles"?

Pode um Mouro banhar-se duas vezes nas águas do mesmo Douro, sem que oiça "elitista", "pseudo-cosmopolita", "FCP" para aqui, "FCP" para ali?

"E deixei-me ambelesar cun aqueilha magicaçon até que se fizo de nuite."

quinta-feira, maio 20, 2004

So close so far away


em Nasa: Hubble & Keck Teams Find Farthest Known Galaxy in Universe

So far away so close


em Ad Busters

quarta-feira, maio 19, 2004

TPC Escrita Criativa, resposta ao exercício 1

A Maria, uma flausina com ar de lambisgóia, passarinhava pela casa com a prole atrás, tudo moçoilas pestanudas e roliças, enquanto o marido as lobrigava de soslaio e, cochichando ensimesmado contra a azáfama do mulherio, tentava afivelar o guiador da traquitana.

segunda-feira, maio 17, 2004

Gere a minha vida, por favor

Quero que saibais que, como perfil motivacional, sou um innovator / achiever. Moro no código postal 9999-999, para que conheças o bairro onde vivo, qual o perfil da vizinhança, o que compram, o que lêem, que fazem. Por favor gere tu os meus consumos culturais de livros e DVDs, que eu não sou capaz de tomar decisões optimizadas de acordo com o que eu realmente gosto. Por favor toma as minhas medidas nas tuas mãos e gere a roupa que visto, que eu não sei e estou muito cansado para combinar a gravata com a camisa. Mostra-me qual a roupa da revolução e que temas são apropriados à revolta. Diz-me que o sentido da vida é este. Obrigado por me ajudares a deixar de fumar. Prepara o meu diário, onde eu escreva as irrelevâncias do dia.

Vive a minha vida. Oferece-me cookies todos os dias.

Eu pago. Eu sou um MVC.

sexta-feira, maio 14, 2004

Hedonismo Zen



Amor. Liberdade. Arte. Dor. Sonho. Mar. Ser. Trabalho. Amigo. Sim. Sorriso. Fé. Dormir. Verdade.

Nike. Coca-Cola. Hertz. Armani. Sony. Microsoft. Audi. Burger King. Real Madrid. Jameson. Disney.

Cristo. Freud. Marx. Maomé. Einstein. Bach. Platão. Leonardo.

Deus.

Mercado.

Tempo.

(E, cá em baixo, visto ao microscópio, um blogzinho, mudo perante a dimensão das palavras.)

quinta-feira, maio 13, 2004

Táva-se bem

E eu cheio de vontade
De curtir a clandestinidade.
Mudar de identidade.
Desafiar a autoridade.

Táva-se bem...

Não querem mesmo proibir os blogs? Vá-lá...

Amanhã tenho de voltar a ser português, acender a luz, por a outra máscara, voltar à rotina. É triste.

quarta-feira, maio 12, 2004

Não à censu

Entusiasmada pela extracção do R no 25 de Abril a ANACOM quer proibir os blogs.

Assim sendo, o Ser Portugues (Ter que) muda de nome e passa hoje à clandestinidade.

[Afinal, já foi tudo esclarecido. A culpa é do mordomo, isto é, da jornalista estagiária do Expresso, as usual. Que pena. Logo agora, que Ser Portugues clandestino começava a despertar a veia romântica do sector feminino...]

segunda-feira, maio 10, 2004

Based on a true story

Uma ameaça de bomba num health club, em hora de ponta. A urgência do aviso não permite qualquer veleidade de compostura. O espaço exterior enche-se de uma estranha fauna de corpos suados de tanto correr sem destino, corpos suados de sauna, corpos molhados de cloro, apenas uma toalha evita que, mais tarde, já nos seus fatos aprumados, se sintam tão nus e impotentes como agora.

As empresas à volta recolhem-nos em salas de reuniões. Estranhas reuniões. Não consigo deixar de passar por uma delas. Há duas horas atrás, seriam um conjunto elegante (elegância empresarial em tons cinzentos, enfim) num beberete bem disposto. Agora não passam de um bando de refugiados sem eira nem beira. Sic transit gloria mundi.

Não tarda nada, voltarão ao mundo previsível do market share, secretária e ar condicionado.

Esquecerão que foram simples corpos, frágeis e desamparados, actores de teatro amador, representação leve e breve das tragédias do mundo, todos os dias às oito, na sua televisão.

Esquecerão?

quarta-feira, maio 05, 2004

Higiene


[Saída do turno, Metropolis, Fritz Lang]

O vento e a chuva nas trombas, o mar suave com as rochas da praia, furioso com as pedras do porto. Um veleiro que conta as ondas, para cima, para baixo, uff, mais uma! Uma lancha dos pilotos da barra que corta as ondas, mais uma, mais uma, mais depressa. Dois paquetes, há ondas? nem as sinto. O Bugio logo ali à minha frente, quase lhe posso tocar. Gatos, muitos gatos, cheira-lhes a pescadores.

O princípio do mar, ao fim da tarde. E as oito horas de ar condicionado já lá tão longe. Amén.

segunda-feira, maio 03, 2004

O Silicon Valley e a feira de Borba

Fui alvo de gozação generalizada por morar (e trabalhar) no Silicon Valley português, como o Expresso designa Oeiras esta semana. Como se pode expor assim ao ridículo toda a população de um concelho, com uma comparação ignorante, é coisa que ultrapassa a minha compreensão.

O Expresso agora é meu vizinho. Os jornalistas devem andar um pouco zonzos com a possibilidade de estacionar o carro onde querem. Vai daí, começam a inventar estas coisas. Espero que se habituem depressa.

O Terrorista Agradecido

Parece que anda a circular na net uma das variantes do Terrorista Agradecido, uma história edificante sobre uma senhora (os pormenores podem variar) que encontra a carteira de um árabe e lha devolve e este, para lhe agradecer, revela-lhe um segredo: "não beba Coca Cola em Maio". Se o terrorista fosse nutricionista, diria "não beba Coca Cola nunca".

Esta história começou com o 11 de Setembro mas, aparentemente, custou a chegar a Portugal. É interessante notar que em Inglaterra havia uma versão em que um empregado irlandês numa bomba de gasolina avisava para a conveniência de alguém evitar Londres em certo dia (também com variantes).

Devem conhecer aquela imagem do turista no alto das torres, com o avião ao fundo. Incrivelmente, esse mesmo turista aparece num dos botes salva-vidas do Titanic e, mais tarde, numa limousine descapotável num certo dia de Novembro de 1963, em Dallas.

Como serviço público para quem acredita nestas coisas, criei à direita a secção "Espanta Espíritos" com referência a alguns sites que avaliam estas lendas urbanas. Recomendo a leitura de algumas delas. Penso que são inventadas pelas mesmas pessoas que inventam as anedotas, mas revelando o seu lado negro.

PS.: Sabem que o logotipo da Coca Cola, lido em espelho, significa, em árabe, "não a Maomé, não a Meca"? Pensem nisso, e vejam se não se percebe aqui uma tramóia judaico-cristã.