quinta-feira, abril 15, 2004

Tábua Rasa

Já o disse aqui: Portugal nunca existiu. Portugal é uma tábua rasa criada por Salazar sobre a qual o génio de António Ferro criou heróis, inimigos, cultura e história. E polícia de bons costumes. Por duas ou três gerações, foram reproduzidas essas crenças e costumes inventados, até se tornarem património genético, aparentemente imutável, aparentemente sangue do nosso sangue.

Nos anos 40 do século XX, na Assembleia Nacional, defendia-se que instruir o povo era perigoso, porque lhe dava "ideias". Quando o conhecimento é a principal riqueza das nações, o gráfico abaixo mostra a verdadeira extensão da tragédia que nos espera. A tábua rasa está aí bem visível.

É o conhecimento que nos permite escolher. Mas entre o analfabetismo do Portugal profundo e a iliteracia e a anemia de valores do Portugal suburbano, o que nos resta é, certamente, rezar.

Não se trata de saber, António, se os ovos de chocolate são melhores que os folares. Trata-se de saber por que motivo eu escolho uns ou outros. Primeira página no manual de marketing.

Nós somos consumidores urbanos, António. Já caímos do paraíso há muito tempo. Reinventá-lo é matá-lo. O pão alentejano que como em Lisboa é melhor que o de Beja. Já não se pode viver o teu paraíso telúrico para além do fim-de-semana ou uns dias mais nas festas de Agosto.

Hoje há opções. E é nas tua opções individuais que decides que globalização queres ter em tua casa. Apenas isso. E se muitos preferirem os folares, como tu, serão os folares a esgotar no supermercado (do Corte Inglès?). Segunda página do manual de marketing.

E quem tem uma 4L não tem de ficar infeliz com o BMW do vizinho. Pode comprar uma Segway.